Calejado, o espirito...

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Calejado, o espírito debruça-se sobre o abismo
calculando as horas, os nomes, os odores que na pele áspera do corpo tem vindo a tatuar
despenha-se, afoga-se na saliva das memórias que o vómito lhe traz
é devolvido ao asco e repugnância mais parecido ao que o formou
Questiona o porquê de não ser apenas uma árvore, um cinzeiro ou até uma varejeira em vez disto

mergulha

mergulho no meu reflexo distorcido pelo vento pelas ondas violentas deste entardecer sorumbático e mescalino
procurando em vão na equidistância que mantenho de mim mesmo encontrar uma âncora
uma mão ou uma língua que me ice desta boca de espinhos onde durmo há anos que já não conto

Porque pensava que um dia seria mais fácil respirar
pensei que o peso do mundo se esvanecesse como o fumo de um cigarro
Mas sei agora que esse peso nunca se tornará mais leve
E que sobre mim, a nuvem pairará sempre carregada e pronta a disparar à queima-roupa
Porque a chuva não lava sempre as mágoas nem as feridas abertas e por cauterizar
mas ensopa-me as roupas, os ossos e o espírito cansado
pelas noites sem dormir a arrancar nomes da pele da boca da cabeça e do coração estrangulado

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Pedro Alves